terça-feira, 30 de dezembro de 2008

A DITADURA VENCEU

Desde a posse de Lula e do início da administração petista no governo federal, acompanha-se pela imprensa o aumento no número de concessões de vultosas indenizações financeiras para indivíduos que se consideram prejudicados pela ditadura militar.

Famosos e bem-sucedidos artistas, jornalistas e políticos, além de desconhecidos de várias categorias profissionais, sem o menor pudor, recorreram aos cofres públicos para receber milionárias compensações por possíveis danos às suas carreiras devido às suas lutas em defesa da liberdade política.

Se impressiona o fato destas indenizações terem valores muito superiores a outras reclamações que se tem notícia no país, como, por exemplo, nos casos que envolvem a indústria de cigarros, talvez seja de maior relevância as suas conseqüências éticas.

Pode-se argumentar que estas recompensas são injustas pois não se pode medir com precisão os efeitos das perseguições realizadas pelo regime militar no desenvolvimento profissional de uma pessoa. Pressupõe-se que todos seriam indivíduos extremamente competentes que teriam atingido o topo de suas carreiras caso não fossem alvo da investida dos militares. Além disto, muitos dos solicitantes alcançaram sucesso profissional justamente por terem seus nomes associados à luta contra a ditadura.

Aqueles que não combateram, ou mesmo apoiaram os militares (a maioria da população brasileira), não podem se queixar a ninguém por não terem sido bem-sucedidos em suas carreiras. Não interessa se a pessoa se considera lesada pelo fato de ter nascido pobre em uma cidade em que não havia oferta de ensino público de boa qualidade. Só os perseguidos pela ditadura são as verdadeiras vítimas. Portanto, embora se mostrem como uma busca por compensação econômica, estas indenizações, no fundo, representam um julgamento de valor, um julgamento ético.

Além de estabelecer que aqueles que foram alvo dos militares são indivíduos de maior competência na sociedade, as milionárias compensações trazem conseqüências mais importantes.

Se os solicitantes de indenizações queixam-se de ter sido prejudicados em suas vidas pela perseguição da ditadura, eles também estão dizendo que a sua luta por liberdade política e de opiniões foi danosa, que só vale a pena combater o autoritarismo se recebermos em troca uma boa recompensa econômica. Enfim, o que importa na vida não é a defesa da liberdade, não é a honra desta causa, mas a busca por conforto econômico.

Do Brasil à China, os sonhadores de esquerda viraram capitalistas pragmáticos, se renderam às supostas evidências de que o acúmulo de dinheiro é o grande valor humano. De românticos passaram a cínicos (uma metamorfose mais comum do que se pensa, pois é provável que sejam, como se diz popularmente, faces de uma mesma moeda ou farinha do mesmo saco).

Os outrora comunistas e socialistas dão razão aos militares que os acusavam de ser jovens tolos e cheios de sonhos idiotas. Não é só o comunismo que está errado, mas também a defesa do direito de querer mudanças, de pensar diferente, de buscar liberdade. Não são só as idéias, as teorias, que defendiam que se mostraram um engano, mas, da mesma maneira, as suas ações, as suas atitudes de questionamento. O que importa é defender a autoridade, a ordem e a segurança, principalmente a financeira. E todo conformismo com uma resposta, seja ela qual for, como valor humano maior, representa uma ditadura.

Os indenizados, boa parte senhores que já atingiram a casa dos setenta anos ou mais, tratam de garantir maior conforto para si e seus familiares. Boas viagens, bons hospitais em caso de necessidade, imóveis valiosos, uma grande reserva no banco, uma excelente herança.

Esta será a herança que deixarão para seus filhos e netos, este será o exemplo que passarão para as gerações mais novas. Suas batalhas, o fato de abrir mão de sua comodidade, correr riscos e até mesmo ter sido alvo de sofrimentos físicos em nome de acreditar que era possível mudar as coisas, em nome da liberdade, tudo isto foi anulado em troca de milhões de reais.

Se esquecem que talvez, assim, estejam apagando a própria razão de suas vidas. Colocam uma pá de cal em cima dos únicos momentos que valeram as suas passagens pelo mundo, os únicos instantes que deram significado às suas existências. Anulam a si próprios. Deixarão dinheiro, conformismo e mais nada.

3 comentários:

Só no blog disse...

Oi, Márlio. Este é o tipo de artigo que a gente gostaria de ver publicado na grande imprensa, para se sentir um pouco recompensado, ou vingado. Mas, como eles não publicam, a gente se realiza lendo aqui. Valeu.

Márlio Vilela Nunes disse...

Oi, Sérgio. Como é bacana que exista uma ferramenta como a internet que permite a qualquer pessoa ter seu o blog e se responsabilizar pelo que escreve. Tão bom quanto encontrar um comentário do amigo aqui no blog. Obrigado.Grande Abraço,
Márlio

tolaylo disse...

Ninguém se preocupa em questionar os ex comunistas e socialistas que viraram defensores do neo liberalismo. Tanta gente de mídia. O cinismo é tanto que criaram a Comissão da Verdade. Ora, não foram os militares que encaminharam, lá atrás, o Brasil à esta direita de hoje? Deveriam ser condecorados então. Que hipocrisia ´esta?